A castanheira centenária

A árvore guardiã olhou fixamente para o menino durante um certo tempo e foi então que uma coisa estranha aconteceu. O menino sentiu os olhos pesados, eles foram se fechando, mas não se fecharam completamente. Ele via e não via, não estava nem dormindo, nem acordado. Algumas vezes já tinha se sentido assim, de manhãzinha, antes de levantar da cama. Ou então na escola, quando fazia muito calor, no meio da aula em que não conseguia prestar atenção ao que o professor dizia. Ele era transportado para outros lugares, como se estivesse sonhando acordado.

Igualzinho ao que estava acontecendo com ele naquele momento. Com os olhos semicerrados, o menino se viu num outro lugar.

Ele estava embaixo de uma árvore muito velha, que tinha o tronco grosso e raízes que se afundavam para dentro da terra. Do tronco saiam muitos galhos, igualmente grossos e nodosos, que se ramificavam para todos os lados em outros galhos que iam tornando-se mais finos, à medida que se estendiam e se curvavam para baixo. As folhas eram grandes e largas, cobrindo completamente os galhos, formando uma copa com um enorme teto redondo.

O menino, já tinha visto árvores como aquela, quando ia de férias para a praia, mas nunca daquele tamanho. Agora ele entendia por que lhe davam o nome de chapéu do sol. Parecia mesmo um grande chapéu que criava uma sombra protetora num amplo espaço redondo em toda a volta da árvore. Olhando para cima, viam-se pedacinhos de céu azul por entre as folhas. Por esses mesmos pequeninos espaços, a luz penetrava criando no chão de areia, aqui acolá, inúmeros focos brilhantes em contínuos movimentos. Rodeando a árvore centenária havia uma porção de arbustos, um ao lado do outro, formando uma cerca baixa.

Ali ele se sentia protegido e acolhido. Tudo era sossegado, mesmo que se pudesse ouvir um rumor constante do vaivém das ondas do mar bem próximo, mas que ele não conseguia ver do lugar onde estava.

Pelo chão de areia espalhavam-se castanhas de casca dura e avermelhada e folhas secas; lagartos surgiam de repente, correndo de um lado para outro e desaparecendo no meio dos arbustos. De vez em quando, minúsculos raminhos com três ou quatro folhinhas verdes brotavam a um palmo do chão.

A árvore, bem no meio, era imponente, silenciosa e segura. Mesmo que fosse centenária, era vigorosa, forte, firme e muito simpática.

Quando ela começou a cantar, o menino achou a voz dela parecida com a de sua avó. Grave, profunda e melodiosa, mas ao mesmo tempo alegre e cheia de ternura, a voz da árvore centenária cantava:

Morava na areia

Sereia

Mudei-me para o sertão

Sereia

Aprendi a namorar

Sereia

Com um aperto de mão

Ô sereia

Cajueiro pequenino

Sereia

Carregadinho de flor

Sereia

Eu também sou pequenina

Sereia

Carregadinha de amor

Ô sereia

O menino achou aquela música linda, dava vontade de dançar. Ele nunca a escutara antes.

– É uma cantiga de roda muito antiga. Existem muitas e muitas outras como essa, hoje em dia quase ninguém conhece mais.

– A senhora lembra a minha avó. Cada uma das minhas folhas é uma história que eu guardo para contar, uma cantiga que eu lembro para cantar.

– Minha nossa, então são muitas histórias! A senhora pode me contar uma delas?

– Claro – disse a árvore centenária – é o que eu mais gosto de fazer na vida – e ela começou:…

Autor desconhecido

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